Publicado em 22/10/2025

Eu quero te tirar o peso de um esforço desnecessário: entender as coisas.
É em vão. Quer dizer, pode ser útil agora, mas a médio e longo prazo só vai te confundir mais.
Talvez você não tenha entendido ainda. A dinâmica da nossa produção tem sido sobre velocidade: chegar mais rápido, fazer mais rápido o que precisa ser feito, entender mais rápido, comprar mais rápido, amar mais rápido.
Aceleração do tempo, dos transportes, da informação, da tecnologia, das mercadorias, da moda, dos memes, das relações, dos amores, do sexo, do afeto, do cuidado e, com isso, de corpos.
Quanto mais velocidade, menos você entende.
Você aceita algoritmos cuspindo (outputs) informação pré-selecionada e filtrada sem saber como anúncios feitos das suas últimas conversas (inputs) chegaram até você.
Também aceita smartphones trocando de interface todo ano, paga por isso, mesmo numa cultura consumista insustentável.
Mas quando corpos mudam a si, suas próprias interfaces, formas corporais, linguagens e modos de se relacionar você tenta entender e definir o processo nas suas limitadas compreensões.
Tão alienado pelas mercadorias e vetores informacionais, mas tão curioso por corpos trans e queer.
Ou talvez negue nossa existência para poder se alienar nos mecanismos de recalcamento cisgênero.
Não se preocupe. Corpos terão velocidade como das mudanças e lançamentos das tecnologias, as regras de gênero ficarão mais confusas e ininteligíveis para você até inexistirem.
A limitada forma de definir tudo em 0 e 1 a partir de um genitalismo cairá por terra quanto mais rápido as tecnologias de modificação corporal chegarem. Você está preparado?
Aceite não saber. Já não sabemos de nada. A alienação profunda de cada um de nós pode nos libertar se ao invés de tentarmos buscar razões para a diferença, abraçarmos a multiplicidade.
Você está livre de entender para aceitar, porque você já aceita muito sem entender ou questionar.
Nossa agência não está em entendermos as coisas. Ela está nos fluxos em que decidimos nos colocar e para onde eles levam a nós e o que alimentam.
Mas se me permite tentar entender algo, fica a pergunta:
Por que aceita não entender algumas coisas mas quer tanto entender outras para aceitá-las?
Talvez isso diga algo sobre você.